O ano de 2020 foi, no mínimo, atípico. No início de janeiro, seria impossível imaginar que a Covid, que já dava sinais de que chegaria ao Brasil, teria o efeito indireto de transformar o vinho na bebida da quarentena. Ou que o consumo per capita cresceria tanto a ponto de chegar ao patamar de 2,80 litros por maiores de 18 anos, um crescimento de 30% em relação ao ano de 2019 entre a importação e a comercialização das vinícolas nacionais.
Nesta retrospectiva, a Ideal reuniu os principais indicadores e fatos de cada trimestre. Relembrar a montanha russa que foi 2020 pode ajudar a planejar 2021 com um olhar mais apurado.
PRIMEIRO TRIMESTRE
O ano começou com otimismo. No final de 2019, com recorde no consumo per capita, 2,13 litros por maiores de 18 anos, foi anunciado que a ST (Substituição Tributária), antigo pleito do setor, cairia em São Paulo a partir de fevereiro, depois de ter caído em outros estados como Rio Grande do Sul, Paraná, Santa Catarina e Bahia. A perspectiva era que os demais Estados seguiriam esta tendência, reduzindo os impactos negativos desta medida tributária. Em esse novo cenário, com maior fluxo de caixa, importadores e lojistas começavam a planejar crescimento das vendas.
O otimismo começou a perder força em meados de fevereiro, quando a desvalorização do real frente ao dólar se intensificou. Em março, os casos de Covid confirmados e a decisão de fechar bares e restaurantes acabaram com o otimismo e trouxeram apreensão. As importadoras decidiram segurar suas compras no exterior. O dólar fechou o trimestre cotado a R$ 4,90, valor 24% maior do que a média de 2019.
SEGUNDO TRIMESTRE
Foi um trimestre de incerteza, que crescia a cada novo dado econômico divulgado. Abril começou com uma projeção negativa para o PIB, de – 1,2% (que chegou a – 6,5% em junho). O dólar se valorizou ainda mais frente ao real, terminando o trimestre com a cotação de R$ 5,20 (em maio, o real estava ainda mais desvalorizado, com US$ 1 valendo R$ 5,64, valor 43% acima da média do ano anterior).
Os importadores repensaram suas estratégias. A partir de abril, a importação de vinho passou a ser liderada pelos supermercados, pelas empresas de e-commerce e pela VCT, braço da vinícola chilena Concha y Toro. O foco passou a ser os rótulos com valor Fob (custo) mais baratos, medida que procurava compensar, ao menos em parte, a forte desvalorização da moeda brasileira. Em abril, o valor FOB da caixa de 9 litros de vinho importado ficou em U$ 24; em maio, em US$ 22 a caixa. E todas as empresas se voltaram os canais de venda digitais ou ao delivery, com a perspectiva de que o ontrade, como hotéis e restaurantes, ficassem fechados por um longo período
Junho chegou com otimismo para o mercado: mesmo com o cenário econômico ruim e as pessoas em casa, a venda de vinhos cresceu e o valor FOB médio do produto importado subiu para US$ 25,70 a caixa de 9 litros. Houve uma procura tanto pelos vinhos nacionais como pelos importados. O consumo per capita exemplifica esta reação. Em 2019, o consumo per capita para os maiores de 18 anos tinha sido um recorde, chegando a 2,13 litros, neste segundo trimestre, chegou a 2,81.
TERCEIRO TRIMESTRE
O terceiro semestre começou com recorde no volume comercializado de vinhos. Em julho, foram 63,4 milhões de litros vendidos em um único mês. Este volume foi impulsionado, principalmente, pela venda de brancos e tintos nacionais e porque as importadoras foram as compras para repor estoques.
Os números de agosto trouxeram um sinal de alerta. Pela primeira vez desde março, houve queda na comercialização de vinhos. As análises iniciais apontaram que o consumo de vinho teria chegado a seu recorde e começaria a cair com a volta das atividades presenciais. Mas setembro mostrou que a queda de agosto havia sido pontual: as importações voltaram a crescer e começaram a faltar insumos, principalmente garrafas, para o envase do vinho brasileiro. Foi registrado também um crescimento da venda de espumantes brasileiros (as borbulhas vinham sentindo a queda de consumo, com a diminuição das festas).
O trimestre fechou com otimismo, com o consumo per capita superando a casa dos 3 litros por habitante maior de 18 anos por ano. Do lado econômico, o dólar ficou estável em R$ 5,40, e as projeções do PIB indicaram uma queda do movimento econômico menor do que o previsto, na casa dos 5,11%.
QUARTO TRIMESTRE
As eleições norte-americanas deram o tom do início do quarto trimestre. O real se valorizou frente ao dólar, com as notícias da vitória de Joe Biden. Em novembro, por exemplo, a cotação do dólar abaixo dos R$ 5,30 fez vários importadores acelerarem as suas compras, pensando não apenas no final de ano, mas no começo de 2021.
O mercado se estabilizou no consumo na casa dos 50 milhões de litros mensais, um novo patamar. E novembro registrou novo recorde de importação – pela primeira vez, a importação deste mês foi maior do que as registradas nos meses de agosto, setembro ou outubro. Os produtores nacionais continuaram enfrentando a falta de insumos, o que prejudicou algumas vendas pontuais, e deixou claro um gargalo do setor, que precisa ser solucionado. Mesmo assim, a comercialização do vinho produzido no Brasil seguiu como o principal impulsionador do crescimento do consumo da bebida no Brasil. É possível prever que o mercado de importação fechará o ano com mais de 16 milhões de caixas de 9 litros de vinho e espumante, crescimento de mais de 20% em relação ao volume importado em 2019 e os produtores brasileiros comemorando o melhor ano da história. O desafio será manter esse novo patamar.